O tempo é apressado. Momentâneo, transitório. A existência é algo abstracto, tal é a efemeridade dos momentos. E se ao menos existisse a capacidade inata de registar cada sorriso ou gesto, esta transitoriedade seria receptível. Talvez por isto é normal que se viva omnipresente no passado de maneira constante, pois tenta-se recuperar freneticamente tudo aquilo que outrora já nos pertenceu em vez de se procurar algo novo. A novidade parece sempre algo funesto, uma autêntica antítese de tudo aquilo que se conhece.
Sonhei contigo a fumar um cigarro no parapeito da minha janela. Olhávamo-nos mutuamente como dois desconhecidos, juntos pelas circunstâncias da vida. O quarto gelado e escuro envolvia-nos numa atmosfera estranha e enigmática. O mistério do teu olhar não me incomodou. Antes pelo contrário, conquistou-me. Saber que nunca te iria conhecer completamente em nenhum dia das nossas vidas, fez com que te considerasse tudo aquilo que eu procurara em todas as pessoas com quem me cruzara.
Desejei que a minha alma se envolvesse com a tua. Só os corpos se envolveram. Corpos quentes do momento que a tua frialdade separava cada vez que saía da cama.
Esperei até obter a resposta. Esperei durante minutos, horas, dias, meses e até anos. Esperei que a resposta fosse um acenar proveniente de um adeus irrevogável ou uma união de corpos. Não houve resposta.
Gastei os parapeitos das janelas à espera. Hoje se passares por lá ainda encontras a miúda dos cabelos lisos e da franja de ar pensativo.